Ainda lembro do livro de caligrafia, com aquelas letras pontilhadas para escrevermos em cima, vovó viu a uva e essas coisas. Eu adorava. Lembro dos livros todos, cachorrinho Samba na fazenda, O caso da borboleta Atíria, Açúcar Amargo, O Pudim de Natal. Quando entrei no segundo grau, a escola deixou de fazer sentido pra mim, mas os livros sempre estiveram lá. Bibliotecas, locadoras de livros (como as de VHS), livros emprestados. Tudo o que eu aprendi, a partir dos 14 anos, foi nos livros. E na rua, mas essa é outra história.
Quanto piores eram as aulas, mais vontade eu tinha de ler. O mesmo aconteceu na faculdade, sem saber o que estava fazendo ali, só comecei a realmente aprender história depois de preparar as minhas próprias aulas.
O meu amor pelos livros vem do acesso privilegiado, mas também dessa vontade incessante de saber sobre as coisas do mundo e de outros mundos. Meus livros hoje são instrumento de trabalho, o conhecimento que resulta deles é o que tenho de melhor.
Esses tempos publiquei essa foto e tive uma conversa muito legal, mas dolorosa, sobre como livro hoje é sinal de elitismo. Desde a crítica aos memes na campanha do Lula até profissionais que compram bibliotecas falsas para decoração, livro é artigo de luxo.
Não consigo deixar de pensar em Paulo Freire, em como lá no século passado a alfabetização era um sonho e uma porta de entrada para uma outra vida. Havia uma vontade imensa de saber e aprender e acessar esse universo que só vem pelas letras.
Hoje temos uma população massivamente alfabetizada, porém iletrada. Alguma coisa se perdeu aí, porque a escola obrigatória continua sendo o espaço de disciplina e a leitura vai se distanciando cada vez mais da vontade de saber sobre o mundo.
Acho triste. Nenhuma pureza aqui, apenas a ideia de que TODOS os recursos culturais, dos mais simples aos mais complexos, deveriam poder ser acessados por todas as pessoas.
Para o dia do livro, eu queria que todas as pessoas pudessem ter escolhas e ler histórias e criar seus próprios caminhos.