Eu passo muito tempo nas redes sociais, a desculpa há anos é a minha pesquisa, mas o motivo é que preciso preencher o vazio e sobrepor algo às vozes que gritam aqui dentro. Em um cenário de pandemia, isolamento e completo caos, tornou-se uma estratégia de sobrevivência.
Todos os dias muitas tragédias, pequenas e grandes, mas há algo do cotidiano das pessoas que sigo que sempre me alenta. Leio textos maravilhosos em blogs (sim, boomer), poesia postada em montagens fotográficas e ouço lives de quem está produzindo um som que salva.
E me encanto com tantas coisas, as minhas próprias pequenas aventuras domésticas, a arte que chega até mim, e as pequenas coisas. Essas são tão importantes quanto. Provavelmente não fazem sentido para você, mas no meu momento atual são o que permite que eu mantenha um fio que me liga à realidade.
Percebi quando assisti pela décima vez o trecho da live do Porchat com o Boulos, rindo sem parar. O inesperado, a naturalidade dos dois, nada indicando uma condenação daquela nudez e, obviamente, o fato de que seria algo que eu mesma poderia ter feito. O ordinário do acaso num tempo de vigilância e suspensão do real. Uma delícia.
Também quando apareceu a entrevista do Renato Teixeira explicando a história da música Romaria. A primeira música que aprendi a cantar, na escola, lembro da sala das aulas de música, da graça com cai-pira-pira-pira-pora, e o verso “o meu pai foi peão, minha mãe solidão” que até hoje acho um dos mais lindos da música brasileira. E vi ali todo o imaginário da minha infância, Sérgio Reis e o menino da porteira, a rádio AM, a fè cristã, a música caipira, Elis. Um Brasil que desaparece.
E hoje, com o vídeo do Supla em Cubatão nos TTs. A memória de passar de carro pela cidade símbolo da poluição terceiro mundista, que virou referência ecológica. A garota de Berlin, a Japa Girl, a Marta na TV preto e branco falando sobre sexo no TV Mulher, o Suplicy no show do Mano Brown. Eu em Volta Redonda me sentindo em Blade Runner. E o Supla que, vindo de uma família quatrocentona, poderia ser um completo idiota mas é esse cara gente boa aí.
Guardo todos esses frames, os monto e desmonto, aos poucos, dou um sentido só meu. Sobrevivo. Não precisa fazer sentido, só precisa ser.
Quarentena. Dias demais de isolamento.